A Apple está descobrindo que não é fácil se livrar da Samsung.
Uma prova disso é o esforço dela para encontrar outra empresa, que não sua feroz concorrente Samsung Electronics Co., para fazer os chips que são o cérebro dos seus iPads e iPhones. Em junho, depois de anos de atrasos por problemas técnicos, a Apple fechou acordo com a Taiwan Semiconductor Manufacturing Co. para que esta fabrique alguns desses chips a partir de 2014, disse um executivo da TSMC.
Apesar do acordo, a Samsung seguirá sendo o principal fornecedor até o fim do ano que vem, disse um desses executivos.
A Apple é um dos maiores clientes da Samsung para processadores e chips de memória. Mas elas concorrem diretamente no mercado de telefones celulares e passaram boa parte dos últimos dois anos brigando nos tribunais por causa de patentes. Nenhuma das empresas quis comentar.
Há dez anos, elas eram parceiras ideais. Aí a Samsung começou a lançar os smartphones que hoje ultrapassam o iPhone em vendas. Ao longo do último ano, os executivos da Apple expressaram preocupação com sua dependência da Samsung, que reduz o poder de negociação da Apple e sua capacidade de usar tecnologias diferentes, segundo pessoas que conversaram com executivos da Apple.
A Apple cortou algumas compras da concorrente sul-coreana. Ela não compra mais da Samsung as telas do iPhone e diminuiu as compras das telas do iPad, dizem fornecedores. A Apple vem comprando mais chips de memória flash — componente essencial para o armazenamento de dados — de outros fabricantes, dizem ex-executivos da Apple e funcionários de outros fornecedores de chips.
Mas a Apple continua muito dependente da Samsung. O microprocessador que controla os iPods, iPhones e iPads é feito pela coreana. Alguns iPads novos ainda usam telas da Samsung, segundo exames feitos por especialistas.
O dilema da Apple é que a Samsung é a maior fabricante de alguns dos mais sofisticados componentes de que ela precisa.
As alternativas da Apple "não são boas, por isso eles continuam comprando da Samsung", diz Michael Marks, que ensina um curso sobre cadeias de suprimento na Faculdade de Pós-Graduação em Administração da Universidade de Stanford e é presidente do conselho da SanDisk Corp., que vende chips de memória para a Apple. Além disso, o setor de tecnologia tem hoje poucas grandes empresas com quem fazer parcerias.
O acordo feito pela Apple em junho para começar a comprar chips da TSMC é um marco. A Apple há muito queria fabricar seus próprios processadores e comprou uma empresa de chips em 2008 para começar a projetar ela mesma seus chips. Mas seguiu contando com a Samsung para produzi-los.
Em 2010, a Apple e a TSMC começaram a discutir uma parceria para a fabricação de chips, dizem executivos da TSMC. Em 2011, a Apple pediu para investir na TSMC ou que a empresa dedicasse parte de suas instalações à produção dos chips da Apple, dizem os executivos. O presidente da TSMC, Morris Chang, recusou ambos os pedidos porque a companhia queria conservar sua independência e flexibilidade na fabricação, dizem.
A TSMC pretende começar a produzir os chips em massa no início de 2014 usando tecnologia avançada de 20 nanômetros que deve reduzir o tamanho e o consumo de energia deles.
A Apple não é a primeira a ver uma feliz parceria se transformar em concorrência. Em 1980, a gigante dos chips Intel Corp. aceitou compartilhar sua tecnologia com a Advanced Micro Devices Inc. Depois, a AMD se tornou uma grande concorrente e a Intel passou anos tentando desfazer o acordo.
A Samsung tem razões para manter viva sua relação com a Apple. A expectativa era de que as encomendas da Apple para a Samsung deveriam atingir US$ 10 bilhões em 2012, diz Mark Newman, analista da Sanford Bernstein em Hong Kong. Isso representa uma fatia significativa dos 67,89 trilhões de wons (US$ 59,13 bilhões) que a Samsung teve com o negócio de componentes, que inclui chips e telas. O processador da Apple, do qual a Samsung é hoje a única fornecedora, respondeu por US$ 5 bilhões das compras em 2012, calcula Newman.
A séria relação entre a Apple e a Samsung remonta aos primeiros tocadores de música iPod, na década de 2000. Durante os primeiros anos, os iPods usaram pequenos discos rígidos para armazenar músicas. Mas a Apple queria usar chips de memória flash, que eram mais confiáveis e consumiam menos energia.
O problema é que esses chips custavam caro e os preços podiam ter grandes oscilações. À medida que a demanda pelo iPod disparava, a Apple assinarou um acordo com a Samsung para garantir o fornecimento, segundo pessoas a par da estratégia. Os primeiros iPod Shuffle da Apple com memória flash chegaram às lojas em 2005. A Samsung depois passou a fabricar também os processadores do iPhone, lançados em 2007.
A Apple não estava alheia às ambições da Samsung de concorrer com ela, dizem ex-executivos. A Samsung comunicou à Apple que havia estruturado seu negócio de modo a manter os dois lados separados e prometeu impedir que trocassem informações, dizem ex-executivos e outras pessoas a par do assunto.
Alguns executivos da Apple não gostavam de enriquecer um lado do negócio da Samsung enquanto o outro atacava a empresa americana. Compartilhar com ela informações sobre as previsões de negócios era especialmente doloroso, dizem ex-executivos.
Em 2008, a Apple tirou da Samsung uma parte maior das suas compras de memórias flash, dizem ex-executivos e outras pessoas a par da estratégia. A Apple anunciou em 2009 um pagamento adiantado de US$ 500 milhões à Toshiba Corp. para fornecimentos de memórias flash.
A iniciativa deu resultado. A Samsung, que há cinco anos fornecia grande parte dos chips de memória flash da Apple, hoje responde por menos de 10%, estima Newman, da Sanford Bernstein.
A Apple deixou de usar telas da Samsung no iPhone 4, lançado em 2010. A empresa americana ajudou a Sharp Corp. e a Toshiba Corp., que também fazem telas, a expandir suas fábricas, segundo pessoas a par da situação.
Outras tentativas de alijar a Samsung falharam. Em 2011, quando a Apple estava projetando a terceira geração do iPad, ela pediu à Sharp para produzir as novas telas de alta resolução, diz uma pessoa próxima à companhia japonesa. Mas no lançamento, em março de 2012, a maioria dos aparelhos tinha tela da Samsung. A Sharp teve dificuldades para produzir as telas em massa, diz outra pessoa próxima da empresa.
Em março, a Samsung fechou a compra de uma participação de 3% na Sharp e um acordo para comprar mais telas de LCD dela. O negócio tornará a Samsung o quinto maior acionista da Sharp e também um importante cliente, possivelmente limitando o poder de barganha da Apple.
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